Carta 25 publicada a 27 janeiro 2012

A forma extraordinária instala-se em Winnipeg

Nos últimos meses, depois da rentrée, Winnipeg, Capital da província canadiana do Manitoba, assistiu ao regresso da missa tradicional. Deixamos aqui o artigo que o semanário católico Prairie Messenger dedicou a este acontecimento, no número de 21 de Setembro de 2011, seguido dos nossos comentários.


I – O artigo de Brenda Suderman no Prairie Messenger

No dia 4 de Setembro, à hora da missa, os bancos da igreja católica de Santa Ana de Winnipeg estavam repletos de paroquianos desejosos de rezar numa língua que a maior parte nem sequer percebe.

Aí, a missa das 10 horas, agora semanal, é dita em latim. Quem a celebra é o Padre Jeffrey Burwell, jesuíta.

«Acompanhar a liturgia, mesmo com a ajuda do missal, pode vir a revelar-se uma experiência assinalada pela graça para quantos não têm uma experiência prévia da missa tradicional ou que a ela não assistem desde os anos 60», explica este sacerdote. «É no entanto bem claro que os participantes têm um desejo real de participar activamente. Com uma devoção assim, muito em breve eles compreenderão a liturgia em toda a sua plenitude.»

Forma extraordinária do rito romano é a expressão que se usa para a missa tradicional em latim. Depois do Concílio Vaticano II, que se concluiu em 1965, os católicos romanos obtiveram permissão para celebrar a liturgia na sua própria língua, chamando-se a isso a forma ordinária.

«Oficialmente, a língua da Igreja é o latim. As outras religiões têm as suas línguas sagradas: para o Islão é o árabe; para o judaísmo, o hebreu; e para o hinduísmo, o sânscrito», explica o Padre Burwell, de 36 anos, que ensina estudos católicos na Universidade de Manitoba e estudou latim durante o seu primeiro ciclo na Universidade de Regina.

«Há algo de especial numa língua sagrada. Ela enraíza-nos na nossa tradição»

Kateri Muys, uma das paroquianas, estava desejosa de participar da missa, depois de já ter tido essa experiência durante o tempo em que estudara na Academia Nossa Senhora Sede da Sabedoria, em Barry’s Bay, Ontário.

«Realmente, não há nada que se compare», comenta esta jovem de 21 anos, habitante de Oak Bluff. «Uma vez que se começa a rezar em latim, já não se quer voltar atrás, ao que se fazia antes».

Nos primeiros dois domingos, celebrou-se a missa solene, com a duração de 75 minutos. Mas agora, celebra-se a missa baixa (1 hora), ficando a missa solene reservada para os dias de festa, explica o Padre Burwell.

A primeira missa oficial em latim em Winnipeg, desde há cinco decénios, teve lugar com o apoio das arquidioceses de Winnipeg e São Bonifácio, depois de o Papa Bento XVI ter declarado que aqueles que quiserem rezar usando a liturgia latina tradicional possam ter a oportunidade de o fazer, diz Mons. James Weisgerber, arcebispo de Winnipeg. «Fomos encorajados a expô-los a esta realidade, a dar seguimento a esta tradição da Igreja», explica Mons. Weisgerber. «Mons. LeGatt (bispo de São Bonifáco) e eu cooperamos com esta cerimónia porque queremos tornar esta liturgia acessível a toda a comunidade.»

Ordenado numa altura em que o latim ainda era largamente utilizado, Mons.Weisgerber diz que se vai esforçar por desempoeirar o seu latim para poder substituir o Padre Burwell ao domingo de manhã se necessário.

O facto de já ter assistido a missas tradicionais em Londres e em Saint-Louis, no Missouri, convenceu John Cortens, de Winnipeg, a juntar-se ao grupo de Santa Ana aos domingos de manhã. «É de facto muito tocante, um ambiente de grande piedade e recolhimento o que se vê nesses lugares», recorda ele. «Em comparação, nós somos um grupo heteróclito que tenta fazer o mesmo em pequena escala.»

Para Anselmo Ragelti, que é acólito em Santa Ana, as celebrações em latim são também uma ocasião para conhecer e aprender a liturgia de uma nova maneira. Contrariamente à forma ordinária, em que é a assembleia que responde ao sacerdote ao longo da liturgia, durante a missa tradicional são os seis acólitos que recitam as respostas.

«Foi algo realmente muito bonito», explica este rapaz de 14 anos, falando das suas experiências anteriores da forma extraordinária, por ocasião de um campo de jovens católicos no Dakota do Sul. «O latim é muito bonito e é fácil de transpor para música.»

A homília do Padre Burwell é dita em inglês, e o mesmo se passa com as leituras da Escritura. Ele está confiante quanto ao facto de que os seus novos paroquianos estarão cada vez mais à vontade com o latim e, em breve, já saberão qual é a diferença entre o gradual e uma genuflexão.

«As pessoas que assistem à forma extraordinária em Santa Ana receberão ao mesmo tempo o alimento de uma bela celebração da Eucaristia sobre o altar e aquele que vem da comunidade de amizade orante que se forma nos bancos da assembleia», conclui ele.


II – As reflexões de Paix Liturgique

1) A primeira coisa a chamar-nos à atenção na narrativa deste caso de aplicação do motu proprio Summorum Pontificum é o facto de o celebrante ser um jesuíta. E é uma informação que condiz com muitas outras que nos chegam de várias partes do mundo: a Companhia de Jesus, da qual uma das marcas distintivas é, em princípio, o seu voto de obediência ao Papa, parece estar a entrar pouco a pouco no espírito de Bento XVI e a abrir-se à reforma da reforma. Não ainda de maneira institucional e maciça, mas aos poucos e nas bases. Rezemos para que este movimento se amplifique e para que se venha a completar, abarcando também a Província de França…

2) Bispos que obedecem: eis aí outra lição que nos chega de Winnipeg. Mons. Weigerber, de 73 anos, arcebispo de Winnipeg, e Mons. LeGatt, de 58 anos, tiraram ambos lições da instrução Universae Ecclesiae. Desde Junho que convidaram os fiéis das suas dioceses ligados à forma extraordinária, agrupados na associação São Gregório II, para um encontro destinado a discutir a possibilidade da aplicação do motu proprio Summorum Pontificum. E foi deste encontro, organizado em Julho, que nasceu a celebração na igreja de Santa Ana.

3) Seja isso intencional ou não da parte do autor, o facto é que o artigo do Prairie Messenger, para além do arcebispo de Winnipeg, não da a palavra senão a jovens: o Padre Burwell, um acólito, uma estudante… É assim que, no Manitoba como em Roma (veja-se a nossa carta 24), o que causa uma viva impressão em quem olha de fora, é a atração exercida pela forma extraordinária sobre os jovens. Aí está a prova, uma vez mais, de que a liturgia tradicional é um instrumento a não ser negligenciado no processo da nova evangelização desejada pelo Santo Padre, e um tesouro para toda a Igreja, não apenas para aqueles que ainda conheceram a Igreja pré-conciliar.