Carta 30 publicada a 22 junho 2012

Em Cognac, o bispo, Mons. Dagens, recusa-se a aplicar o motu proprio

A diocese de Angoulême (350.000 habitantes) é uma das dioceses de França onde o motu proprio Summorum Pontificum não é aplicado de todo em todo. Não há sequer uma paróquia onde se possa assistir à forma extraordinária do rito romano, seja durante a semana, seja mesmo ao domingo. Existem, porém, dois pedidos na diocese, um na cidade episcopal, Angoulême, e outro em Cognac. O pedido de Cognac, apresentado pela primeira vez em 2007, e renovado no Verão de 2011, acaba de ser objecto de três artigos no jornal diário local, Sud-Ouest. Este mês, deixamos aqui a tradução do primeiro destes três artigos, publicado a 11 de Junho, acompanhado pela carta mediante a qual, em Agosto de 2011, o representante dos peticionários informava filialmente o bispo do pedido.


I – Missa em latim: o apelo dos “Tradis” de Cognac
Um artigo de Sophie Carbonnel, Sud-Ouest, 11 de Junho de 2012

A pílula custa a descer. Para Antoine Pierron, médico em Cognac, tradicionalista à cabeça dos “Tradis do Papa” do local, é chegado o tempo de trazer a lume para praça pública o seu pedido. O seu desejo: o regresso à missa celebrada em latim de acordo com o Motu Proprio Summorum Pontificum do Papa Bento XVI. De facto, este decreto promulgado em Julho de 2007, autoriza a celebração do rito em latim para «qualquer grupo estável de fiéis ligados à tradição litúrgica precedente», de acordo com o rito anterior ao Vaticano II.

Para acolher o Motu Proprio, a diocese deu início a uma missa mensal em Genac, em Julho de 2008, celebrada pelo Padre René Valtaud de 87 anos. Um ano mais tarde, este eclesiástico reformou-se. E nesta diocese a missa em latim via o seu fim ao mesmo tempo que o pároco de Genac soltava o seu último fôlego. «Desde então, os católicos de Cognac que desejem beneficiar desta liturgia não têm outra solução que não seja irem até à diocese vizinha, em Saintes», exclama desolado Antoine Pierron.

E acrescenta: «A diocese de Angoulême é uma das raras dioceses de França privadas da missa em latim. Apenas quatro das 93 dioceses de França se encontram nesta situação.»

UMA PAREDE DE SILÊNCIO

Três anos depois da última missa celebrada integralmente em latim na igreja de Genac, Antoine Pierron, apoiado por «cerca de 36 famílias de fiéis de Cognac», tendo embora dado mostras de perseverança, hoje exprime já a sua impaciência. «Somos Tradis do Papa, não somos uns fanáticos. Há na diocese muitas pessoas que querem beneficiar da missa em latim. Os fiéis de Cognac tomaram a iniciativa de vir falar em nome de todos.»

Este médico, com provas na mão, garante que chocou contra uma parede de grande frieza, que vai do pároco de Cognac ao bispo da diocese, Mons. Dagens. Um bispo estranhamente silencioso que, de acordo com o que nos assegura o médico, «jamais se deu ao trabalho de responder às nossas cartas».

Hoje, os “Tradis do Papa” escreveram uma nova missiva ao bispo, começando assim este texto: «Mons. Dagens, ainda que não abra o seu coração, pedimos-lhe que nos abra e empreste os seus ouvidos». O tempo da liturgia é já coisa do passado. O Padre Baudoin de Beauvais, pároco de Cognac, não se quer arriscar a tomar uma decisão. «Eles têm de falar com o bispo.»

Aquele eclesiástico guarda uma certa reserva quanto à possibilidade de reinstaurar uma missa em latim na região de Cognac. «Primeiro é preciso saber ao certo quantas são as pessoas que mostram tal desejo.» E reflectir sobre os meios logísticos de modo rigoroso. «Somos apenas dois a garantir todas as missas de Cognac. Neste momento, nem pensar em acrescentar mais uma missa», afirma o Padre Baudoin de Beauvais.

O principal argumento do sacerdote é a seguinte constatação: «O latim era a língua mais falada no mundo romano. Hoje, fala-se francês. Tenho quase a certeza que se falássemos em latim a estas pessoas, elas não iriam entender nada.»

Mas estes “Tradis do Papa”, que supostamente se recusariam a viver de acordo com os tempos, mesmo assim montaram um site na internet em que as pessoas se podem exprimir livremente…em francês.


II – A carta do peticionário com a comunicação ao bispo

Cognac, 18 de Agosto de 2011

Excelência Reverendíssima,

Em Janeiro de 2007, algumas semanas antes da promulgação do Motu Proprio Summorum Pontificum do nosso bem amado Papa Bento XVI, escrevi-lhe com o intuito de lhe pedir que outorgasse a celebração na nossa diocese da Santa Missa de acordo com o Missal de 1962 do Beato João XXIII, e, de preferência, em Cognac, onde resido com a minha família.

Jamais me chegou uma resposta, embora saiba, por um sacerdote amigo, que a minha carta foi lida e comentada em conselho episcopal.

Estando ocupado com as minhas obrigações familiares e profissionais, não renovei o meu pedido, apesar de ter continuado a seguir com interesse as tentativas de aplicação do texto pontifício na diocese.

Hoje, sustentado pela adesão de um grupo estável de famílias de Cognac e de paróquias vizinhas, faço questão de o informar que formularemos um pedido formal ao próximo pároco de Saint Léger (de que sou paroquiano assíduo desde há mais de 15 anos, nutrindo grande amizade pelo Padre Raymond), assim que ele chegue.

Dir-me-á certamente que o Motu Proprio, assim como a recente instrução Universae Ecclesiae de 30 de Abril, publicada a 13 de Maio, estipulam expressamente que compete desde logo ao pároco pôr à disposição dos demais os frutos da generosidade do Santo Padre. Todavia, parece-me justo, e da mais elementar boa educação, dar-lhe conhecimento deste nosso próximo passo. Além do mais, estando informado, estará V. Ex.a em melhores condições de nos ajudar caso venha a surgir alguma dificuldade.

Peço-lhe, Ex.cia Reverendíssima, que creia na expressão dos meus sentimentos muito filiais e devotados.

Antoine Pierron.



III – Os comentários da Paix Liturgique

1) O Dr. Pierron e o conjunto de peticionários de Cognac fazem parte das inúmeras pessoas silenciosas dentro da Igreja que vivem a própria fé no seio da respectiva paróquia segundo o ritmo da liturgia ordinária, mas que desejariam poder beneficiar dos frutos do Motu Proprio Summorum Pontificum. Ao longo de 15 anos, como o frisa na carta enviada ao seu bispo, o Dr. Pierron manteve relações excelentes com o seu pároco. E ainda que assistisse todos os domingos à liturgia moderna com a sua família, a verdade era que aspirava a ter algo mais, e algo de melhor… mas fazia-o em silêncio, no segredo da sua alma. Isto até que o Santo Padre tornou a liturgia tradicional acessível a todos…

2) A 10 de ulho de 2007, o bispo de Angoulême, Mons. Dagens, asseverava compreender «as razões que conduziram o Papa Bento XVI a promulgar (o) Motu Proprio», afirmando, a justo título, que «não se pode instrumentalizar» a missa e que ela é «antes de tudo o sacramentum caritatis, o sacramento da caridade». Professava igualmente acreditar «na importância dos diálogos aprofundados que versam sobre o que essencial da fé». Mas nunca se dignou responder aos peticionários de Cognac: Porquê este desprezo?

3) Relativamente a este caso de Angoulême, o respeito pela verdade exige que não esqueçamos a experiência permitida por Mons. Dagens no início de 2008. À época, e bem rapidamente por comparação com o que é normal nos episcopados franceses, Mons. Dagens tinha de facto respondido favoravelmente aos peticionários de Angoulême. Mas as condições eram tais, que a experiência não viria a durar muito tempo! Na verdade, não concedeu senão uma missa mensal numa aldeia situada a 20 km da sede episcopal e celebrada por um sacerdote de 87 anos. Como era de esperar, mal surgiram os primeiros problemas de saúde do celebrante, logo a missa foi suspensa, e não foi nomeado qualquer substituo.

4) No mês de Outubro próximo, Mons. Dagens estará em Roma para a visita ad limina dos bispos de França: nessa altura, acompanharemos então com atenção a reunião que terá com os oficiais da Cmissão Ecclesia Dei. Talvez estes lhe queiram também perguntar acerca da sorte reservada ao Padre Texier, coadjutor da paróquia de Saint-Yrieix, na periferia de Angoulême, que, para aplicação do MP, tinha proporcionado a forma extraordinária do rito romano aos seus fiéis antes de se ver obrigado a abandonar a diocese sob pressão do antigo vigário-geral de Mons. Dagens, o Padre Braud!