Carta 109 publicada a 28 maio 2021
SUMMORUM PONTIFICUM , A OBRA MAJOR DE BENTO XVI EM PERIGO ?
Há já algum tempo que se multiplicam os sinais de alerta em relação ao Summorum Pontificum: a maioria dos bispos italianos e as figuras mais influentes da Cúria, em especial no seio da Secretaria de Estado, convenceram o Papa de que a tradicionalização litúrgica do clero mais jovem é algo de “preocupante” e de que o “direito à missa tradicional”, instituído pelo motu proprio de Bento XVI, é um atentado ao Concílio Vaticano II.
Esta Segunda-feira de Pentecostes, ao abrir em Roma a reunião da Conferência Episcopal Italiana, CEI, o Papa primeiro procedeu a uma lavagem do cérebro dos bispos italianos, que andam a arrastar os pés, tardando a pôr-se em estado de sínodo generalizado, pois consideram ser uma ideia com grandes custos e totalemente inútil. Manias da idade, chegam alguns a dizer.
Depois, quando os jornalistas já tinham deixado a sala, o Papa passou a tratar de um tema que colhe grande união entre os bispos italianos: a execração do Summoru Pontificum. Foi aí que o Papa confirmou a próxima publicação de um documento que o pressionaram a redigir, destinado a “reinterpretar” o motu proprio de Bento XVI. A publicação deste documento tem sido retardada, pois parece ter provocado objecções e ter sido travado, especialmente por parte do Cardeal Ladaria e da Congregação para a Doutrina da Fé, que avançaram o argumento de que isso iria provocar problemas e perturbações em todo o mundo, com oposições incontroláveis. Apesar de tudo isso, a Secretaria de Estado estaria a pressionar para a publicação do texto, cujas principais disposições seriam as seguintes:
- as comunidades que celebram segundo a antiga forma poderiam continuar a fazê-lo;
- ao invés disso, os sacerdotes diocesanos, a partir de agora, teriam de obter uma permissão específica.
É evidente que um tal documento, inaplicável em numerosos países, entre os quais a França, terá apenas um alcance simbólico: fazer com que a celebração da missa tradicional deixe de ser um direito, passando a ser apenas uma excepção tolerada.
O grupo de pressão anti-missa tradicional, presente na Universidade de Santo Anselmo, na Cúria e na CEI, está assim a arrastar o Papa para um gravíssimo erro político: o descontentamento latente de uma grande parte de católicos diante de certas abordagens doutrinais, as fraquezas diante da deriva e desvios alemães, a multiplicação de declarações no mínimo desconcertantes, tudo isto corre o sério risco de se agravar até que as pessoas fiquem fartas e se diga “basta”.
Em vez de se fazer um esforço para compreender o que pensa e quais as aspirações de uma grande parte do povo cristão, e plena de vida, optar-se-ia por empurrá-la até ao desespero e à exasperação.
Está a estarçalhar-se deliberadamente a paz na Igreja, especial a paz litúrgica, para a qual Bento XVI tanto contibuiu com o seu texto sábio e libertador: anuncia-se, pois, um retorno aos piores anos do pós-Concílio.